MENSAGEM
Dia Mundial do Refugiado | 20
de junho de 2025
Neste
Dia Mundial do Refugiado, a Rede CLAMOR Brasil eleva sua voz em profunda
comunhão com milhões de irmãos
e irmãs que carregam em seus corpos
e memórias as marcas do
deslocamento forçado. São rostos que trazem gravadas as cicatrizes da
violência, da perseguição e do abandono, mas que também irradiam a luz
resiliente da esperança e a força transformadora da dignidade humana. Em cada
olhar que busca um horizonte de paz, em cada história interrompida que anseia
por continuidade, reconhecemos o clamor da humanidade ferida e o apelo
inadiável à nossa responsabilidade evangélica, social e política.
De
acordo com o relatório global do ACNUR (2024), mais de 120 milhões de pessoas em todo o mundo foram forçadas a deixar suas
casas, sendo 43,4 milhões de refugiados que
cruzaram fronteiras internacionais em busca de proteção. No Brasil, segundo o
Comitê Nacional para os Refugiados (CONARE), já são mais de 150 mil pessoas reconhecidas como
refugiadas até 2024, além de alguns milhares em processo de solicitação de
refúgio. Estes não são números ou estatísticas distantes: são pessoas
concretas, com nomes, sonhos e direitos inalienáveis, que nos interpelam a
construir pontes de solidariedade onde hoje existem muros de indiferença.
Vivemos um tempo marcado por conflitos armados, perseguições
sistemáticas e catástrofes climáticas que continuam expulsando pessoas de suas
casas, países e narrativas de vida. Diante desse cenário doloroso, reafirmamos
com convicção: a guerra é sempre uma
derrota da humanidade. Como nos ensinou o Papa Francisco: "Ninguém se salva sozinho, só é
possível salvar-se juntos" (Carta Encíclica Fratelli Tutti, n. 32). A
paz não é uma utopia distante, mas um dever urgente e inadiável. O Santo
Papa Leão XVI nos exorta: "Que cada
comunidade se torne uma 'casa de paz', onde aprendamos a transformar a hostilidade através do diálogo, onde a justiça seja praticada e o perdão seja cultivado. A paz não é uma utopia espiritual: é um caminho humilde, tecido de gestos cotidianos, que entrelaça paciência
e coragem, escuta
atenta e ação
transformadora." (Discurso aos Bispos da ConferÊncia Epicopal Italiana, 17
de junho de 2025).
O
Ano Jubilar 2025, sob o lema "Peregrinos
da Esperança", nos convida a caminhar solidariamente com aqueles que peregrinam pela vida,
frequentemente sem destino certo, sem terra própria e sem voz que os represente. Esta caminhada compartilhada é expressão concreta da
nossa fé e humanidade. A tradição social da Igreja, desde a histórica encíclica
Rerum Novarum (1891) do Papa Leão
XIII, sempre defendeu que cada ser humano possui direitos inalienáveis ao
trabalho, à vida digna e à mobilidade, dentro
dos princípios da justiça e da caridade.
Esta visão se atualiza hoje na defesa
intransigente dos migrantes e refugiados,
que têm sua dignidade negada e
seus direitos fundamentais frequentemente ignorados.
Nossa
defesa, porém, precisa ser nutrida por um olhar sensível e interseccional, que
reconheça como as difíceis travessias do refúgio impactam de maneiras diferenciadas cada pessoa: mulheres
enfrentam vulnerabilidades específicas e riscos de violência de gênero; pessoas
negras e indígenas carregam o peso adicional do racismo estrutural; aqueles em
situação de pobreza vivenciam barreiras ainda mais intransponíveis. Cada
história de refúgio é única e merece uma acolhida que considere estas múltiplas
dimensões da exclusão e da vulnerabilidade.
Nesta data significativa, a Rede CLAMOR reitera seu apelo
pela construção da paz entre os povos,
pela superação das causas estruturais que geram o refúgio e pela abertura de
caminhos legais, seguros e dignos para quem busca proteção. Reforçamos
também a necessidade urgente de que o
Estado brasileiro publique e implemente a Política Nacional de Migração,
Refúgio e Apatridia. Esta política, construída de forma participativa por
organizações da sociedade civil, organismos internacionais e setores do poder
público, constitui instrumento essencial para garantir acolhida qualificada,
integração social e proteção integral aos milhares
de pessoas que já fazem parte do tecido social brasileiro. É fundamental
que a construção dessa política seja nutrida pela mesma sensibilidade
interseccional, priorizando a escuta atenta e valorizando o protagonismo dos
próprios sujeitos em situação de refúgio. Nada sobre eles pode ser decidido sem
eles: suas vozes, experiências e saberes devem ocupar o centro dos processos
decisórios, reconhecendo-os não como beneficiários passivos, mas como agentes
transformadores de suas próprias
realidades e construtores ativos de uma sociedade
mais justa e acolhedora.
Como Rede Eclesial que se estende pelo continente
Latino-Americano e Caribenho, renovamos
nosso compromisso de seguir escutando com atenção, acompanhando com proximidade
e defendendo com coragem cada vida marcada pelas fronteiras da indiferença e do abandono. Que cada comunidade cristã seja tenda aberta ao
encontro e espaço de
reencontro com a dignidade humana e os valores transformadores do Evangelho. Em
cada gesto de acolhida, em cada porta que se abre, em cada abraço que cura,
fazemos presente o Reino de Deus entre nós.
Que
neste Jubileu possamos ser, como Igreja e sociedade, sinais vivos da esperança que não decepciona (Rm 5,5). Que o clamor
dos refugiados continue nos interpelando e mobilizando, até que todas as
pessoas tenham um lar seguro, um nome respeitado, um futuro possível e uma
história de pertencimento. A esperança que proclamamos não é ingênua, mas
comprometida. Não é passiva, mas transformadora. É a esperança que se faz
presente no gesto concreto, na política pública justa, na comunidade acolhedora
e na sociedade que reconhece em cada refugiado não um problema, mas um irmão ou
irmã em humanidade.
Que
esta data nos inspire a continuar caminhando como peregrinos da esperança,
tecendo redes de solidariedade que atravessem fronteiras e derrubem muros. Que
possamos ser, em cada território, sementes de uma civilização do amor que
floresce no encontro, na justiça e na paz. Enquanto existir uma história
interrompida pela violência, nossa missão permanece viva. Pois acreditamos que
outro mundo é possível, onde cada pessoa possa dizer: "aqui também é minha
casa, aqui também posso sonhar, aqui também posso reconstruir minha história de
dignidade e esperança."
Rede CLAMOR Brasil
20 de junho de 2025 –
Dia Mundial do Refugiado
www.miguelimigrante.blogspot.com
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