O representante do ACNUR no Brasil, Davide Torzilli, durante abertura do 3º Encontro Anual do Fórum Empresas com Refugiados
©️ ACNUR/Masouma Soha Yawari
Atualmente, o Brasil emprega formalmente cerca de 200 mil pessoas refugiadas e que necessitam de proteção internacional. Dessas, mais de 12 mil ocupam a posição em 55 empresas e organizações que fazem parte do Fórum Empresas com Refugiados. O dado foi apresentado nesta quinta-feira (31) em São Paulo, durante o encontro anual do fórum.
Criado em 2021 pela Agência da ONU para Refugiados (ACNUR) e o Pacto Global da ONU – Rede Brasil, o Fórum Empresas com Refugiados busca promover estratégias de apoio à população refugiada no Brasil por meio do trabalho e geração de renda. Atualmente, mais de 130 empresas de todo fazem parte da iniciativa. O 3º Encontro Anual do Fórum Empresas com Refugiados, promovido em São Paulo nesta semana, contou com a presença de cerca de 180 pessoas, entre representantes da sociedade civil, Governo, profissionais refugiados no Brasil e setor privado.
No evento, foram apresentados em primeira mão dados coletados em agosto de 2024 em pesquisa feita com 72 membros do fórum. Foi constatado um aumento de 24% de contratações após se tornarem parte da iniciativa. Das empresas que responderam, 50% afirmaram contratar também jovens em vagas de aprendiz e estágios e 11% como prestadores de serviços pela modalidade de pessoa jurídica. Das pessoas refugiadas contratadas, a maioria ocupa cargos operacionais e ganha em média de 2 a 3 salários mínimos e 25% das empresas que contratam têm pessoas refugiadas em cargos de liderança.
“Esse resultado expressivo mostra a relevância desse trabalho em rede com as empresas para transformar a vida da pessoa refugiada no Brasil”, destacou o representante do ACNUR no Brasil, Davide Torzilli. “O Fórum é uma iniciativa sustentável e que cresce a cada dia, com empresas engajadas em contratar pessoas refugiadas, na sua formação e capacitação. A integração e a inclusão dessas pessoas vêm através do trabalho digno. E as empresas, por meio do trabalho formal, contribuem para a construção de uma nova vida - uma vida com dignidade, autonomia e qualidade aqui no Brasil.”
“As empresas do Fórum estão engajadas nessa importante causa de inclusão e contratação de pessoas refugiadas. Também temos com o ACNUR outras iniciativas conjuntas, como a plataforma Refugiados Empreendedores, que reúne cerca de 160 empreendimentos de pessoas refugiadas no Brasil”, ressaltou a diretora de Pessoas, Governança e Integridade no Pacto Global, Adriana Alves. “São agendas que remetem diretamente em tudo o que acreditamos no Pacto - agenda 2030, liderança feminina, raça como prioridade, salário digno, entre outros.”
Exemplo de boas práticas
Os resultados dos esforços do fórum junto ao setor privado refletem-se não só no aumento da contratação de refugiados no mercado formal de trabalho brasileiro, mas também no desenvolvimento profissional dessas pessoas, relacionando isso à perspectiva de integração local e parcerias orientadas por soluções para garantir os direitos e a dignidade das pessoas refugiadas no país.
Durante o evento, várias empresas puderam compartilhar suas experiências com a contratação de pessoas que necessitam de proteção internacional. Uma delas é o Hospital Israelita Albert Einstein. Segundo a superintendente de Sustentabilidade do Hospital, Priscila Surita, desde 2021 a entidade tem falado mais abertamente sobre o papel das pessoas refugiadas em sua história institucional. “Desde então, temos trabalhado com parceiros para causar impacto não só contratando as pessoas para serem nossas colaboradoras, mas para construir projetos de impacto e valor”, afirma. Ela também ressaltou que, embora muitas empresas evitem a contratação por conta da falta de experiência, no hospital, o processo tem sido o inverso. “Se você der oportunidade, a pessoa refugiada, em pouco tempo, vai estar performando até mais que alguém com muita experiência. São pessoas de muito valor”.
Outra empresa que compartilhou suas experiências foi a Solar Coca-Cola, engarrafadora com 13 fábricas no Brasil. Atualmente, apenas em Manaus (AM), as mulheres venezuelanas representam 50% da força de venda da empresa. “Temos um resultado muito gratificante em termos de inclusão e de produtividade. Em um ano de atividade junto com o ACNUR, já contratamos 88 pessoas refugiadas vindas de 4 países diferentes, que falam espanhol e francês, e que permitem que a gente amplie de forma muito significativa as referências e as experiências, e que contribuem com o nosso aprimoramento enquanto companhia”, afirma Arthur Ferraz, head de Relações Externas da Solar Coca-Cola.
Daibelys Nunes é uma dessas pessoas. Ela é venezuelana e trabalha há um ano como promotora de vendas da área comercial da Solar Coca-Cola em Manaus. Apenas nesse período, ela já ganhou três premiações como melhor promotora de vendas na região e agora treina novas colaboradoras. “Sou mãe de dois filhos e não há nada mais dolorido para uma mãe do que ter para o almoço e não ter para uma janta. Uma oportunidade de trabalho dá para sustentar uma família, seguir sonhando e crescendo”, declara.
Outra empresa participante do Fórum é a Foundever, dedicada ao atendimento ao consumidor e que tem um terço de suas interações com pessoas que não falam português. Com a contratação de pessoas que necessitam de proteção internacional, a empresa não apenas supriu uma demanda interna com mais qualidade, mas também passou a estimular que outras empresas abram oportunidades no mesmo sentido. “A contratação de pessoas venezuelanas hoje se mostra fundamental para a companhia. Hoje temos 700 colaboradores refugiados e migrantes, mas ainda é pouco quando se pensa que, todos os dias, mais de 200 pessoas venezuelanas chegam ao Brasil por Roraima. Estou muito engajado em divulgar essa iniciativa a outros CEOs. É uma grande responsabilidade, mas também um sucesso e um orgulho que tenho”, afirma o CEO da Foundever, Laurent Delache.
A venezuelana Kiria Flores está no Brasil há seis anos e trabalha atualmente como supervisora de operações na Foundever. Ela iniciou na empresa em uma posição de assistente, mas em pouco tempo teve a oportunidade de, dentro da própria empresa, receber capacitação para liderar equipes que têm o espanhol como língua nativa. “Quero seguir crescendo na empresa para continuar ajudando a família e ter um futuro melhor no Brasil com a compra de uma casa própria”, planeja.
Sobre o Fórum Empresas com Refugiados
O Fórum Empresas com Refugiados foi lançado em junho de 2021 pela Agência da ONU para Refugiados (ACNUR) e o Pacto Global da ONU – Rede Brasil com o objetivo principal de promover a contratação de refugiados no mercado de trabalho brasileiro. Ao longo de quatro anos, mais de 130 empresas e organizações empresariais aderiram a essa iniciativa, fortalecendo seu impacto por meio da troca de melhores práticas, treinamentos, intercâmbios de experiências entre os membros e pela sensibilização e engajamento do setor privado na inclusão de refugiados no Brasil. Os impactos alcançados têm feito do Fórum referência na América Latina quanto à mobilização e engajamento do setor privado. O desenvolvimento de iniciativas como estas, pode posicionar a região como líder na inclusão socioeconômica de pessoas refugiadas e migrantes sob o conceito da agenda Cartagena+40.
O 3º Encontro Anual do Fórum Empresas com Refugiados foi promovido com o apoio de Amcham, BRF, Miguel Neto Advogados Associados, Solar Coca-Cola, Lojas Renner e Instituto C&A.
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