quarta-feira, 30 de abril de 2025

Chegada ao Brasil de Cidadãos Afegãos Beneficiários de Vistos de Acolhida Humanitária

  


Cerca de 700 refugiados afegãos serão recebidos e receberão suporte para moradia e acesso a serviços públicos básicos no Brasil pelo Governo Federal em parceria com organizações da sociedade civil. O trabalho ocorrerá por meio do Programa Acolhida Humanitária por Patrocínio Comunitário. As primeiras quatro famílias de afegãos (18 pessoas) a serem acolhidas chegarão, nesta terça-feira (29), no Aeroporto de Guarulhos (SP).

A iniciativa foi lançada em setembro de 2024 por meio do edital de chamada para seleção e credenciamento de organizações da sociedade civil para a implementação do programa. Para executar, a entidade fica responsável por captar recursos de doadores comunitários e privados. O programa é coordenado pela Secretaria Nacional de Justiça (Senajus).

Foram recebidas propostas de dez organizações. Duas já assinaram acordo de cooperação com a Senajus: a Panahgah Associação de Apoio Humanitário Internacional, que acolherá 500 afegãos, e o Instituto Estou Refugiado, que trará 224 pessoas.

As entidades ficam responsáveis por garantir que os afegãos que chegam ao Brasil tenham acesso a direitos básicos, como saúde, educação e assistência social, além de apoio para inserção no mercado de trabalho e aprendizado do português.

Para facilitar a entrada e a permanência de afegãos no País, foi publicada a Portaria MJSP/MRE nº 24/2021, atualizada pela nº 42, que regulamenta a concessão de vistos temporários e autorizações de residência para proteção humanitária a cidadãos afegãos e a pessoas afetadas por graves violações de direitos humanos ocasionadas pelo regime.

https://www.gov.br/mj/pt-br

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sábado, 26 de abril de 2025

MPF defende adesão do Brasil à convenção internacional para proteção de trabalhadores migrantes e familiares

 

Refugiados em operação de acolhimento promovida pelo governo federal - Foto: Agência Brasil

A Procuradoria Federal dos Direitos do Cidadão (PFDC) - órgão do Ministério Público Federal (MPF) - defendeu a incorporação da Convenção das Nações Unidas sobre a proteção aos trabalhadores migrantes e suas famílias ao direito brasileiro. O tema é objeto do Projeto de Decreto Legislativo (PDL) 405/2022, em tramitação no Congresso Nacional.

A Convenção Internacional sobre a Proteção dos Direitos de Todos os Trabalhadores Migrantes e dos Membros de suas Famílias foi adotada pela Assembleia Geral das Nações Unidas em 1990. Ela é um instrumento que representa um marco na evolução do regime internacional de direitos humanos, ao garantir proteção aos trabalhadores migrantes e seus familiares, sem considerar sua situação migratória.

Em nota técnica, a PFDC destacou que a importância da incorporação do tratado decorre também do aumento global da migração, devido a múltiplas causas, e cujos índices refletem no Brasil. Esse cenário demonstra a necessidade e a urgência da medida, para defender e promover os direitos humanos da população em condição migratória em território nacional, defende a PFDC.

Direitos do trabalhador migrante - A convenção internacional sobre trabalhadores migrantes, composta por 93 artigos, trata de temas como o combate à discriminação, a garantia de direitos humanos a todos os trabalhadores migrantes, direitos específicos para migrantes documentados, regras para categorias especiais e orientações sobre a aplicação do tratado.

O texto busca promover condições de trabalho dignas, saudáveis, legais e igualitárias para migrantes e suas famílias, sem distinção de sexo, raça, religião, nacionalidade, classe social ou qualquer outra condição.

Entre os direitos assegurados estão o de deixar livremente qualquer país, inclusive o de origem; o direito à vida; e a proteção contra tortura e trabalho análogo à escravidão. A convenção também garante a liberdade de pensamento, consciência e religião.

Na esfera judicial, reconhece o direito a um julgamento justo e público por um tribunal competente, independente e imparcial. O documento ainda reconhece que os migrantes que não têm documentos fazem parte do conjunto de trabalhadores migrantes e, por isso, também devem ser considerados nas garantias previstas.

Conclusão – A PFDC se posiciona pela aprovação do PDL 405/2022 como um passo importante para que o Brasil se alinhe a compromissos internacionais e previsões contidas na Constituição Federal e na Lei de Migração, reforçando o compromisso do país com os marcos globais e regionais do direito internacional quanto aos direitos humanos.

“A medida representa um esforço pela redução das vulnerabilidades e da exclusão social as quais o referido grupo comumente se vê exposto, buscando assim a efetivação da garantia da dignidade humana, que é fundamento do Estado Democrático de Direito”, sintetiza o documento.

Tramitação – Em 2010, o Brasil iniciou as tratativas para ratificar a Convenção no país. Em maio de 2022, foi determinada a criação de uma Comissão Especial no Congresso Nacional que opinou pela aprovação do texto. Desde então, o tema aguarda análise pelo Parlamento.

A ratificação do acordo assinado pelo governo brasileiro é uma recomendação da Revisão Periódica Universal (RPU). Criada em 2006, a RPU é um mecanismo da ONU por meio do qual os 193 países-membros (entre eles o Brasil) contribuem entre si para melhorar a situação dos direitos humanos no mundo.

Íntegra da Nota Técnica

https://www.mpf.mp.br

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sexta-feira, 25 de abril de 2025

Apenas metade dos refugiados e migrantes com condições dignas de habitação

 


© Envato

Estudo contou com a participação de investigadores do CIES-Iscte e realizou-se em seis países – Itália, Grécia, Irlanda, Portugal, Eslovénia e Hungria.

Apenas metade dos refugiados e migrantes, a nível mundial, vive em condições dignas de habitação, o que “enfatiza a necessidade urgente” de soluções, nomeadamente na Europa, revelou um estudo divulgado pelo ISCTE-Instituto Universitário de Lisboa.

No estudo, datado de dezembro 2024, os investigadores alertam que a crise na habitação afeta migrantes em toda a Europa.

O trabalho desenvolveu-se no âmbito do Projeto H:OUSE, com participação do Centro de Investigação e Estudos de Sociologia (CIES-Iscte), em seis países: Itália, Grécia, Irlanda, Portugal, Eslovénia e Hungria.

“Refugiados e migrantes enfrentam, em toda a Europa, obstáculos significativos no acesso a habitação estável”, defendem os autores.

O estudo identificou discriminação estrutural, obstáculos burocráticos e acesso limitado à informação.

O projeto H:OUSE visa promover o direito à habitação dos migrantes, “ao dar suporte a iniciativas de patrocínio comunitário nos países participantes”.

Esta abordagem junta cidadãos, empresas e organizações para ajudar os recém-chegados, especificou o ISCTE.

Em Portugal, a organização ComUnidade garante alojamento e apoio a refugiados por pelo menos dois anos, através do patrocínio comunitário.

No Projeto Reconstruir, em Tadim, Braga, estão a ser construídas seis casas para famílias migrantes e refugiadas. Já o projeto LAR, perto da Guarda, reabilitou quatro casas devolutas para acolher refugiados com o apoio da comunidade, exemplificou a instituição.

No estudo, refere-se que apesar de em Portugal o direito à habitação estar consagrado na Constituição, nem sempre a eficácia da lei é garantida.

Os autores do trabalho observam que o mercado de arrendamento, no país se caracteriza por uma “volatilidade crescente”.

“A escassez de habitação social, que representa 2% do parque habitacional, aliada a um desequilíbrio entre a oferta e a procura, onde a disponibilidade de casas é insuficiente e os preços estão em ascensão, resulta numa crise de acessibilidade à habitação”, sublinham.

Portugal é também referido como um país que tem captado atenção internacional no mercado imobiliário: “Certas políticas económicas atraíram fundos financeiros estrangeiros e empresas imobiliárias”.

“Programas como o Visto Gold, lançado em 2012 para incentivar a compra de imóveis por não residentes, juntamente com políticas para facilitar a renovação de edifícios e incentivos fiscais especiais, contribuíram para o reforço do investimento internacional”, salienta-se no documento.

O turismo e o fenómeno da “gentrificação” são igualmente citados a propósito da pressão imobiliária que aloca residências a este fim, o que resulta em escassez de habitação.

Em consequência, também os preços da habitação se alinham com um cenário internacional, divergindo dos salários nacionais.

No terceiro trimestre de 2023, de acordo com dados da OCDE, Portugal liderou um índice, seguido pelo Canadá e pelos Estados Unidos, que reflete “o crescente desafio da acessibilidade à habitação” nestes países, onde o custo é “significativamente elevado” em comparação com o rendimento da população.

Lisboa e Porto são os exemplos mais críticos citados pelos autores do estudo, para quem a acessibilidade à habitação se tornou “um desafio significativo” em Portugal.

“Os desafios são particularmente graves para a população estrangeira, que se concentra predominantemente na Área Metropolitana de Lisboa”, referem.

Os migrantes, que constituem “uma parcela significativa” da população urbana, enfrentam obstáculos adicionais no mercado imobiliário. “Mais de 40% do seu rendimento é normalmente gasto em habitação, um valor significativamente superior ao da população local”, observam.

O modelo de aquisição de casa própria, apoiado por políticas estatais, “dificulta o acesso à habitação”, visto que a obtenção de crédito imobiliário é “frequentemente mais difícil” para os migrantes.

Além disso, enfrentam também frequentemente “discriminação habitacional”, xenofobia e obstáculos burocráticos que agravam as dificuldades neste campo.

A sobrelotação e o subarrendamento são comuns na comunidade migrante, mais pela necessidade do que pela escolha, problemas “agravados pela falta de apoio jurídico e social adequado, bem como pela resposta lenta das agências de habitação e migração”.

https://recordereuropa.com

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quinta-feira, 24 de abril de 2025

Pessoas em busca de Refúgio

 


Por Erní Walter Seibert

O número de refugiados, em todo o mundo, não para de crescer. Em todo mundo, pessoas saem do lugar de onde vivem porque não se sentem seguras. Em outros casos, pessoas são obrigadas a sair de onde vivem por questão de revoluções, guerras ou outros problemas. Esta é uma situação antiga da humanidade. Atualmente, no entanto, ela se torna ainda mais visível.

Segundo a ACNUR, agência das Nações Unidas (ONU), dedicada a trabalhar com refugiados, existem hoje mais de 122 Milhões de pessoas nessa situação. Estão entre os países com maior número de refugiados espalhados pelo mundo Síria, Sudão, Venezuela e Afeganistão. No Brasil, vivem refugiados de vários países, como venezuelanos, cubanos, angolanos, ucranianos, sírios entre outros.

A palavra refúgio tem sua raiz na língua latina e significa um lugar para onde a pessoa pode fugir com segurança. Este lugar é o que chamamos refúgio. O refugiado é a pessoa que tenta se proteger em um refúgio.

Nos tempos bíblicos a ideia do refúgio já estava presente. No livro de Números 35.6-34, está registrada uma orientação para o povo de Israel. Ao entrarem na terra prometida, eles deveriam estabelecer cidades onde pessoas que, sem intenção, tivessem matado alguém, pudesse se refugiar com segurança. Não era um lugar para abrigar pessoas que matavam para cometer crimes. Era um lugar onde pessoas que involuntariamente se envolvessem num crime, poderiam viver em segurança.

Mas não era só essa ideia que a Bíblia tinha sobre refúgio. O Salmo 46, que inspirou Lutero a compor o hino Castelo Forte, começa dizendo que “Deus é o nosso refúgio e a nossa força, socorro que não falta em tempos de aflição.” Em seguida, o salmista mostra diversas situações de perigo em que a pessoa pode buscar refúgio em Deus.

A vida humana pode ter tempos de calmaria, mas existem muitas ocasiões em que o perigo é bastante visível. Episódios da natureza como terremotos, maremotos, inundações, incêndios, fazem com que as pessoas busquem um refúgio. Situações políticas, violência urbana, instabilidades sociais são outro tipo de situações em que o refúgio é necessário. Mas, os dramas que as pessoas vivem dentro de suas próprias casas, ou dentro de seus próprios pensamentos, também são indicativos que um refúgio é bem-vindo e necessário. De certa forma, em algum momento da vida, todos buscamos refúgio.

Erní Walter Seibert é Diretor Executivo da Sociedade Bíblica do Brasil e Vice-Presidente das Sociedades Bíblicas Unidas

https://comunhao.com

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quarta-feira, 23 de abril de 2025

Migrantes e refugiados: a construção da figura do ‘indesejável’

 Na 2ª Conferência FAPESP 2025, o antropólogo e etnólogo francês Michel Agier expôs os limites éticos e políticos da sociedade contemporânea. E propôs os conceitos africanos de Zumunti, Teranga e Ubuntu como horizontes cosmopolíticos para uma vida em comum

José Tadeu Arantes| Agência FAPESP – “Indesejável não é uma palavra nova. A priori, não designa ninguém. É simplesmente tudo o que é estrangeiro ao nosso mundo, o que vem de fora e que imaginamos que possa ser ameaçador ou incomodar”: com esta afirmação o antropólogo e etnólogo francês Michel Agier sintetizou a ideia central de sua palestra, a segunda do ciclo Conferências FAPESP 2025.

Nascido em 1953 na cidade de Orange, Agier é diretor de estudos na École des Hautes Études en Sciences Sociales (EHESS), em Paris, e pesquisador sênior emérito do Institut de Recherche pour le Développement (IRD). Sua trajetória acadêmica foi marcada por pesquisas sobre globalização, migrações, exílios, marginalidades urbanas e o papel dos campos de refugiados. Realizou extensos trabalhos de campo na África Ocidental, na Palestina e na América Latina, com destaque para Salvador (Bahia) e Cali (Colômbia).

Suas investigações abordam temas como mobilidades sociais, identidades étnicas e raciais, além de performances culturais em contextos urbanos periféricos. Desde os anos 2000, tem-se dedicado ao estudo de refugiados e migrantes em margens urbanas e campos, desenvolvendo uma crítica às políticas supostamente humanitárias adotadas pelos governos europeus. Entre suas obras mais influentes estão Gérer les indésirables (2008), La condition cosmopolite (2013) e Les migrants et nous (2016). Em 2024, publicou Ilê Aiyê: a fábrica do mundo afro, resultado de sua longa relação com o Brasil.

Embora sua conferência esteja inserida em um conjunto de debates majoritariamente voltados à crise climática e aos preparativos para a COP30, Agier destacou, logo no início, que seu tema não era, afinal, tão diferente assim: “Trata-se de uma desregulação tanto ecológica quanto antropológica do planeta. Por isso, torna-se urgente uma emergência cosmopolítica para podermos enfrentar a emergência climática”.


(foto: Daniel Antônio/Agência FAPESP)

A partir da crise migratória de 2015, Agier passou a investigar o que ele denominou “crise da alteridade”. Um dos conceitos centrais de sua análise é o de “indesejabilidade” – uma noção que se constrói tanto no plano das palavras quanto no das práticas e das imagens. “Nos campos de refugiados, que são ao mesmo tempo lugares de refúgio e de exclusão, essa ambivalência é muito clara: os campos protegem os estrangeiros ou nos protegem dos estrangeiros?”

Com base na etimologia, Agier relembrou que as palavras “hostilidade” e “hospitalidade” derivam da mesma raiz latina e compartilham uma tensão constitutiva. “Essa dualidade ou ambiguidade se encarna em noções que, sendo próximas, designam tanto o inimigo como o hóspede”, disse.

A figura do “indesejável”, segundo Agier, emerge justamente dessa intersecção: “O que é comum em todas as situações é o fato de que a indesejabilidade se experimenta por meio da impossibilidade de ultrapassar um patamar, uma fronteira, um limite”. Ele observa que o termo ganhou uso oficial em documentos administrativos já no século 19, em países como Brasil, Estados Unidos, Alemanha e França. Mas, hoje, ressurge com força em discursos políticos e registros policiais, especialmente na Europa. “Homens jovens, racializados, de origem subsaariana ou norte-africana são designados como indesejáveis com base em sua etnia, precariedade econômica, idade e gênero”, afirmou.

Para Agier, a indesejabilidade expressa-se em níveis diversos: jurídicos, sociais, simbólicos e afetivos. “O princípio da indesejabilidade tem a ver com a ideia de Hannah Arendt da superfluidade: tornar alguém indesejável é torná-lo possível de desaparecer.” Esse processo, explicou, concretiza-se nos campos – de refugiados, de detenção, de retenção administrativa –, que já são o primeiro passo do desaparecimento. “Quem está em um campo está fora do espaço social, do espaço cidadão.”

Agier mostrou que, nas margens da Europa, desde os anos 2000, e de maneira mais sensível desde 2015, o drama dos migrantes nunca parou. “Os governantes queriam se mostrar protetores de seus residentes e cidadãos, designando aqueles estrangeiros como uma ameaça para a segurança e para a identidade dos países. Os muros, as expulsões, os controles de massa, a presença dissuasiva da polícia nas fronteiras, o fechamento dos portos aos barcos salva-vidas deveriam tranquilizar os moradores – supostamente apavorados frente ao espectro de um estrangeiro desconhecido, mas perigoso, predador.”

E isso foi a ponto de privar aquele estrangeiro espectral dos direitos humanos que os mesmos países europeus são tão orgulhosos de terem defendido como universais. Inclusive do mais fundamental dos direitos: o direito à vida. Pelo menos 55 mil migrantes morreram nas fronteiras da Europa desde meados de 1990. Esse número é uma estimativa mínima, pois muitas mortes não são registradas oficialmente.

Mas a indiferença pela vida do “outro” não se restringe ao “outro” que vem de fora, estende-se também ao “outro” que sempre esteve dentro. Ao comentar o caso da Palestina, Agier foi explícito: “Os palestinos foram tornados estrangeiros em sua própria terra. E, quando um ministro israelense diz que os habitantes de Gaza são ‘animais humanos’, isso adquire uma função performativa. Designar alguém como animal é dizer que esse alguém pode ser morto. Isso é o cúmulo da indesejabilidade”.

Um destaque da conferência foi a análise do papel das imagens na construção do imaginário social contemporâneo. “Estamos em um mundo de imagens. E essas imagens produzem medo ou compaixão. Nunca indiferença”, observou Agier. “As imagens que circulam sobre migrantes são cuidadosamente editadas para provocar reações. Se o foco é fechado, vemos uma massa malvestida, ameaçadora. Se o plano é aberto, vemos que, afinal, são poucas pessoas. A composição da imagem é política.”

Apesar do quadro desolador, Agier não se furtou a afirmar a possibilidade de resistência – não apenas como gesto político e horizonte ético, mas também como prática convivial. E mencionou os conceitos africanos de ZumuntiTeranga e Ubuntu como formas ancestrais de relação com o outro que podem oferecer modelos para uma cosmopolítica da hospitalidade. Zumunti, na língua hausa (falada no norte da Nigéria, no Níger e em outros países da África Ocidental), designa uma relação de proteção e acolhimento que amplia o conceito de familiar. Teranga, na língua wolof (falada no Senegal), designa um princípio de reciprocidade: quem recebe hospitalidade se compromete, no futuro, a retribuir esse gesto. E Ubuntu, na língua xosa (falada na África do Sul), que pode ser resumido na máxima de Nelson Mandela “Eu sou porque nós somos”, expressa a ideia de uma humanidade genérica, um princípio de interdependência e reconhecimento mútuo que sustenta a vida em comum.

“Esses conceitos vêm da África. Mas são universais. E oferecem uma contribuição fundamental ao universalismo. Recuperar esses termos é afirmar que a cosmopolítica é indispensável. E que ela depende de uma consciência da vida comum e da necessidade de uma solidariedade que ligue as diferentes escalas de nossa existência planetária”, concluiu Agier.

A 2ª Conferência FAPESP 2025 “Migrações Internacionais: Práticas e Linguagens da Hostilidade e da Hospitalidade” foi presidida por Marta Arretche, professora da Universidade de São Paulo (USP), pesquisadora do Centro de Estudos da Metrópole (CEM) e coordenadora geral de Ciências, Humanidades e Artes da FAPESP. E teve a moderação de Ana Carolina Maciel, professora da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp), onde preside a Cátedra Sérgio Vieira de Mello, criada a partir de acordo entre a Unicamp e o Alto Comissariado das Nações Unidas para os Refugiados (Acnur)

A 2ª Conferência FAPESP 2025 “Migrações Internacionais: Práticas e Linguagens da Hostilidade e da Hospitalidade” pode ser assistida na íntegra em: www.youtube.com/live/FN7wXjQkXpk.

https://agencia.fapesp.br/

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terça-feira, 22 de abril de 2025

Papa Francisco, pastor da misericórdia: um legado que ilumina o caminho da Igreja

 


Mensagem da Direção Geral 

Papa Francisco, pastor da misericórdia: um legado que ilumina o caminho da Igreja A notícia do falecimento de nosso querido Santo Padre, o Papa Francisco, nos deixa profundamente tristes, mas nossa fé na Ressurreição nos conforta.“A vida não termina com a morte, e a esperança cristã é um dom que nos encoraja a seguir em frente”, escreveu ele na Encíclica Fratelli Tutti. Com ele, a Igreja viveu uma época de profunda renovação, baseada na misericórdia, na proximidade com os últimos, no cuidado com a criação e na fraternidade universal, no diálogo incessante com o mundo contemporâneo e na promoção da paz. 

No que diz respeito aos migrantes, desde o início de seu pontificado, Francisco traçou um rumo claro: uma Igreja capaz de acolher, proteger, promover e integrar. Ele realizou isso com palavras e escolhas concretas. Não podemos esquecer sua primeira viagem apostólica, em 8 de julho de 2013, a Lampedusa, símbolo das tragédias do Mediterrâneo.“Quem chorou por esses mortos?”, perguntou ele com voz firme, condenando a '“globalização da indiferença”. Com essa visita, o Pontífice deixou uma marca indelével, trazendo a questão da migração para o centro da missão da Igreja e da consciência coletiva. 

A atenção aos mais vulneráveis representou o coração pulsante de sua ação pastoral. Para ele, os milhares de pessoas forçadas a deixar suas terras não eram números, mas rostos, histórias, pessoas. “Não se trata apenas de migrantes, trata-se de nossa humanidade”, ele repetia com frequência, convidando a sociedade civil a superar o medo e construir uma cultura de encontro. Para Francisco, a Igreja não era uma instituição fechada, mas um corpo vivo em movimento, pronto para sair ao encontro do próximo. “Prefiro uma Igreja machucada, ferida e suja por ter saído às ruas do que uma Igreja doente por ter se fechado”, escreveu ele na Evangelii Gaudium. Foi um convite para não ficar parado, para não ter medo de andar nas periferias da existência. De fato, Francisco desejava uma Igreja que realmente soubesse ouvir o próximo, não fechada em si mesma. “O caminho da sinodalidade é o caminho que Deus espera da Igreja no terceiro milênio”, afirmou com convicção. Desde os Sínodos sobre a Família até o da Amazônia, ele devolveu a voz ao Povo de Deus, promovendo um novo estilo eclesial mais participativo e inclusivo.

 “A misericórdia é o primeiro atributo de Deus”, repetiu ele, e com esse espírito conduziu a Igreja, mostrando a face mais autêntica do Evangelho. Durante a pandemia, ele foi capaz de ser um ponto de referência para o mundo inteiro. Em 27 de março de 2020, em uma Praça de São Pedro deserta e sob uma chuva torrencial, ele presidiu um momento extraordinário de oração, pronunciando palavras que ficaram gravadas na memória coletiva: “Nós nos encontramos assustados e perdidos... Percebemos que estamos no mesmo barco, todos frágeis e desorientados”. Naquela época de incerteza e sofrimento, o Papa reafirmou a importância da solidariedade e do cuidado mútuo. 

Em seu compromisso com os migrantes, ele sempre apoiou a missão scalabriniana com carinho e gratidão. As audiências conosco, missionários scalabrinianos, por ocasião de dois Capítulos Gerais, do 6º Fórum Internacional sobre Migração e Paz, da canonização de nosso fundador e da Conferência de Espiritualidade, foram momentos de encorajamento e reconhecimento de nosso serviço nas fronteiras da mobilidade humana. “Que a santidade de João Batista Scalabrini nos “contagie” com o desejo de sermos santos, cada um de modo original e único, como a infinita imaginação de Deus nos fez e quer que sejamos. E que sua intercessão nos dê alegria e esperança de caminharmos juntos rumo à Nova Jerusalém, que é uma sinfonia de rostos e povos, rumo ao Reino de justiça, fraternidade e paz”. Hoje, mais do que nunca, aceitamos o convite que o Papa Francisco nos fez durante a canonização de nosso fundador em outubro de 2022. Suas palavras e seu testemunho continuarão a iluminar nosso caminho para sempre levar a luz de Jesus Cristo às fronteiras do mundo inteiro. 

Neste dia de sua partida para a Casa do Pai, nós nos unimos a toda a Igreja e a todas as pessoas que reconhecem no Papa Francisco um farol que ilumina nosso caminho em direção a Cristo, para responder ao seu convite de não nos esquecermos de rezar por ele. 

O Superior Geral

Congregação Scalabriniana

www,radiomigrantes.net


segunda-feira, 21 de abril de 2025

Morre o Papa Francisco

 


Anúncio do Camerlengo Farrell da Casa Santa Marta: "Às 7h35 desta manhã, o Bispo de Roma, Francisco, retornou à casa do Pai. Toda a sua vida foi dedicada ao serviço do Senhor e da Igreja"

Vatican News

Morre o Papa Francisco. O anúncio foi dado, com pesar, poucos instantes atrás diretamente da Capela da Casa Santa Marta, no Vaticano, por Sua Eminêcia, o cardeal Farrell, com as seguintes palavras:

"Queridos irmãos e irmãs, com profunda tristeza devo anunciar a morte de nosso Santo Padre Francisco. Às 7h35 desta manhã, o Bispo de Roma, Francisco, retornou à casa do Pai. Toda a sua vida foi dedicada ao serviço do Senhor e de Sua Igreja.

Ele nos ensinou a viver os valores do Evangelho com fidelidade, coragem e amor universal, especialmente em favor dos mais pobres e marginalizados.

Com imensa gratidão por seu exemplo como verdadeiro discípulo do Senhor Jesus, recomendamos a alma do Papa Francisco ao infinito amor misericordioso do Deus Trino."

Ontem, domingo, o Pontífice apareceu na sacada da Basílica de São Pedro para a mensagem de Páscoa Urbi et Orbi, deixando sua última mensagem para a Igreja e o mundo.

https://www.vaticannews.va/

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sábado, 19 de abril de 2025

No Dia dos Povos Indígenas, a luta é por vida, floresta e reconhecimento, diz artista

Marcha pelos direitos dos povos indígenas, em Brasília - Kayo Magalhães / Câmara dos Deputados


Neste sábado (19), Dia dos Povos Indígenas, lideranças de diferentes regiões do país continuam cobrando a efetivação de direitos básicos, como a demarcação de terras e a preservação de seus modos de vida. “Estivemos em Brasília para exigir o que está na lei: o direito ao nosso território, à nossa língua e à nossa cultura”, relembra Txihi.

Uma das principais ameaças no momento é a tese do marco temporal, que, apesar de ter sido derrubada pelo Supremo Tribunal Federal (STF) em 2023, encontra repercussão em outras propostas e leis, como a Lei 14.701. Ela restringe o direito à terra apenas às comunidades que a ocupavam em 1988, data da promulgação da Constituição. “Sendo que fomos expulsos do nosso território pelo próprio Estado brasileiro, sofremos inclusive um genocídio e um etnocídio”, frisa a educadora indígena.

Além do embate jurídico, Txihi denuncia os impactos ambientais causados pela expansão do agronegócio, do garimpo e de grandes empreendimentos em áreas tradicionalmente ocupadas por indígenas. “Quando os colonizadores chegaram nesse território, nós, povos indígenas, estávamos aqui em harmonia. Não havia fome porque havia rios vivos, nossos frutos. O desafio é recuperar o jardim da vida, as florestas que foram devastadas com essa ação predatória,  que vem promovendo destruição ao longo desses anos. São mais de 500 anos de luta, com o desafio de sermos reconhecido, estarmos no nosso próprio território, lutarmos por aquilo que já tínhamos quando estávamos aqui.”

Ela defende que a luta indígena também diz respeito ao futuro do planeta. “Todos devem lutar por alimentos sem agrotóxicos, pelas florestas vivas, pelos rios, porque deles dependemos. Devemos cuidar desse planeta tão lindo que é a Terra”, diz. A expectativa é que temas como justiça climática e soberania alimentar estejam no centro da 30ª Conferência das Nações Unidas sobre Mudança do Clima (COP30), que será realizada em Belém do Pará, em novembro deste ano.

 Além do embate jurídico, Txihi denuncia os impactos ambientais causados pela expansão do agronegócio, do garimpo e de grandes empreendimentos em áreas tradicionalmente ocupadas por indígenas. “Quando os colonizadores chegaram nesse território, nós, povos indígenas, estávamos aqui em harmonia. Não havia fome porque havia rios vivos, nossos frutos. O desafio é recuperar o jardim da vida, as florestas que foram devastadas com essa ação predatória,  que vem promovendo destruição ao longo desses anos. São mais de 500 anos de luta, com o desafio de sermos reconhecido, estarmos no nosso próprio território, lutarmos por aquilo que já tínhamos quando estávamos aqui.”

Ela defende que a luta indígena também diz respeito ao futuro do planeta. “Todos devem lutar por alimentos sem agrotóxicos, pelas florestas vivas, pelos rios, porque deles dependemos. Devemos cuidar desse planeta tão lindo que é a Terra”, diz. A expectativa é que temas como justiça climática e soberania alimentar estejam no centro da 30ª Conferência das Nações Unidas sobre Mudança do Clima (COP30), que será realizada em Belém do Pará, em novembro deste ano.


sexta-feira, 18 de abril de 2025

Governo reforça compromisso com política migratória em visita a centro de acolhida em Brasília

 

Governo reforça compromisso com política migratória em visita a centro de acolhida em Brasília

Uma comitiva do Governo Federal visitou, nessa quarta-feira (16), o Centro de Acolhida Casa Bom Samaritano (CBS), em Brasília (DF), para conhecer as ações desenvolvidas no local pelas organizações da sociedade civil Instituto Migrações e Direitos Humanos (IMDH) e AVSI Brasil, por meio do projeto Acolhidos, que integra parte da Operação Acolhida.

Além da primeira-dama do Brasil, Janja Lula da Silva, participaram autoridades dos ministérios da Justiça e Segurança Pública (MJSP), do Desenvolvimento e Assistência Social, Família e Combate à Fome (MDS) e dos Direitos Humanos e da Cidadania (MDHC).

Janja reforçou o compromisso do governo com uma política migratória mais humana, estruturada e solidária. Ela destacou que o Brasil precisa se preparar para a receber migrantes e refugiados diante do crescente fluxo provocado por crises internacionais. “Essa é uma responsabilidade coletiva”, afirmou.

O secretário Nacional de Justiça, Jean Keiji Uema, enfatizou que o Brasil tem uma legislação moderna, a exemplo da Lei de Migração (nº 13.445/2017), e que a política pública é coordenada pelo MJSP. Ele destacou que o País vive um momento decisivo nessa área e que a Política Nacional de Migrações, Refúgio e Apatridia será lançada em breve.

“O Brasil é historicamente reconhecido por sua postura acolhedora, com medidas concretas para garantir direitos e dignidade às pessoas em situação de refúgio e migração. O acolhimento não é apenas uma ação de governo — é um gesto coletivo de humanidade”, completou Uema.

O secretário Nacional de Assistência Social do MDS, André Quintão, disse que a Operação Acolhida é uma complexa ação humanitária em curso no Brasil que conta com o empenho de quem está na ponta, como a Casa Bom Samaritano. “Mais de 1,2 milhão de venezuelanos e venezuelanas cruzaram as fronteiras em busca de proteção, dignidade e futuro”, disse. Desses, completou, cerca de 140 mil foram interiorizados, ou seja, redistribuídos para diversos municípios brasileiros.

A visita foi guiada pela irmã Rosita Milesi, fundadora e diretora do Instituto de Migrantes e Direitos Humanos no Brasil (IMDH), que, em outubro do ano passado, recebeu o Prêmio Nansen 2024, título global de honraria humanitária da Organização das Nações Unidas (ONU). Ela apresentou o trabalho desenvolvido na casa e destacou a necessidade de cooperação entre Estado, sociedade civil e organismos internacionais para a continuidade do trabalho de acolhida.

Centro de acolhida

Desde a inauguração, em 2021, o Centro de Acolhida Casa Bom Samaritano já acolheu 913 refugiados e migrantes venezuelanos. Atualmente, a Casa abriga 68 pessoas — entre elas, 37 crianças e adolescentes. O local é fruto de uma parceria entre a AVSI Brasil e o IMDH/Fundação Scalabriniana, com o apoio da Conferência Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB), que cedeu gratuitamente o espaço.

O centro oferece moradia temporária por até três meses, com apoio integral às famílias e inserção laboral de pelo menos uma pessoa da família. O acolhimento ocorre por meio da Interiorização Institucional (Abrigo–CBS), estratégia pela qual famílias são transferidas de abrigos de Boa Vista (RR) para Brasília, onde são acolhidas temporariamente e apoiadas para sua integração com autonomia.

A interiorização vinculada à Casa Bom Samaritano integra a estratégia nacional coordenada pela Operação Acolhida e por organizações como a AVSI Brasil e o IMDH. O objetivo é promover a inclusão socioeconômica de migrantes e refugiados venezuelanos, retirando-os da situação de vulnerabilidade nos abrigos de Roraima (RO) e conectando-os a novas oportunidades em outras regiões do País.

Durante a estadia em Brasília, as famílias recebem moradia, alimentação, apoio assistencial e orientação para acesso a serviços públicos, como saúde e educação. Também contam com apoio material como cestas básicas, itens de casa e produtos de limpeza, além de acompanhamento para adaptação à nova rotina.

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quinta-feira, 17 de abril de 2025

Aprovada isenção de taxa de revalidação de diplomas a refugiados no Piauí

 

Aprovada isenção de taxa de revalidação de diplomas a refugiados no Piauí

A Assembleia Legislativa do Piauí (Alepi) aprovou, nesta terça-feira (15), o projeto de lei que garante a isenção das taxas de revalidação de diplomas de graduação, pós-graduação, mestrado, doutorado e pós-doutorado para refugiados nas universidades públicas estaduais.

A proposta é de autoria do vice-presidente da Alepi, deputado Francisco Limma (PT). Segundo o parlamentar, a medida busca assegurar o direito à validação das formações acadêmicas desses profissionais, promovendo sua integração à sociedade e ao mercado de trabalho.

Deputado Francisco Limma (PT) - (Assis Fernandes/ODIA)Assis Fernandes/ODIA
Deputado Francisco Limma (PT)

“Organizações e sistemas de proteção aos direitos humanos têm apontado o alto custo do processo de revalidação dos diplomas - cobrado nas universidades públicas - como um grave obstáculo ao acesso de refugiados ao mercado de trabalho”, afirmou o deputado.

A iniciativa está respaldada pela Lei Federal nº 9.474/1997 e pelo Decreto Federal nº 9.199/2017, que tratam do reconhecimento de refugiados e apátridas no Brasil.

“Deve-se levar em conta o aspecto humanitário e nesse sentido, a implantação de políticas públicas de integração com os refugiados têm a capacidade de agregar capital intelectual e ideias inovadoras aos locais onde eles se estabelecem”, finaliza o deputado.

O texto do projeto ainda prevê que as despesas para execução da lei serão cobertas por dotações orçamentárias próprias, sem acarretar custos extras ao orçamento estadual. Após a aprovação, o texto segue para sanção do Governo do Piauí, que terá até 30 dias para regulamentar a nova legislação.


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