A maioria dos migrantes,
tanto os por razões econômicas como os potenciais refugiados, acabou nas redes
do tráfico ilegal para chegar aos países ricos e seguros do mundo, que cada vez
mais recorrem à "externalização" das fronteiras como solução para conter
esse fluxo de pessoas.
Um primeiro caso de
sucesso da última década foi administrado pela Espanha, quando, em 2006, quase
32 mil imigrantes chegaram às Ilhas Canárias usando barcos de pesca que saiam
da costa africana.
De imediato, a Espanha
firmou um acordo com Senegal e Mauritânia para patrulhar em conjunto seu
litoral, devolvendo os refugiados interceptados no caminho. A política é
mantida até hoje e reduziu ao mínimo o fluxo migratório por essa rota.
O presidente dos Estados
Unidos, Donald Trump, também buscou, sem sucesso, a cumplicidade do México para
devolver ao país vizinho os imigrantes que pediram asilo e chegaram ao
território americano pela fronteira sul.
"Recebemos somente
os que pedem refúgio para o México. Não podemos fazer uma antessala para
aqueles que querem chegar aos Estados Unidos", descartou o secretário de
governo mexicano, Miguel Ángel Osorio, em fevereiro, após uma visita de uma
delegação dos EUA.
O caso mais recente foi
o acordo assinado em março de 2016 pela União Europeia com a Turquia, que
reduziu ao mínimo o fluxo de refugiados que chegava à Europa, que chegou a um
milhão de pessoas em 2015, metade delas fugindo da guerra civil na Síria.
Alguns especialistas em
migração e políticos consideram que Europa e EUA devem ir além e aplicar o
modelo da Austrália: vigilância militar dos mares, interceptação de imigrantes
e envio a centros de detenção em terceiros países, como os existentes nas ilhas
de Nauru e Manus, na Papua Nova Guiné.
Dessa forma, a Austrália
cortou um fluxo de 20 mil imigrantes em 300 botes em 2013. No ano seguinte,
mais ninguém se arriscou.
Além disso, desde 2015,
a Austrália acolhe um número mínimo de refugiados por ano - fixado em 16.250
pessoas no ano fiscal de 2017-2018 - e 12.000 adicionais provenientes da Síria
e do Iraque.
"Os países europeus
têm que literalmente dissociar o ato de ser recuperado do ato de entrar na
Europa e devolver às pessoas ao seu ponto de embarque, por exemplo, a
Líbia", propôs Demetrius Papademetriou, presidente emérito do Migration Policy
Institute, com sede em Washington.
"Procure, recupere
e depois leve essas pessoas a um lugar que não seja a Europa, criando áreas de
processamento de refugiados", disse Papademetriou em entrevista à agência
alemã "DPA".
O ministro de Relações
Exteriores da Áustria, Sebastian Kurz, tem um plano para convencer seus aliados
europeus: que os resgatados no Mar Mediterrâneo sejam enviados diretamente a
campos para migrantes na Tunísia e no Egito. Kurz acredita que a União Europeia
tem capacidade de convencer os dois países a aceitar o plano.
"Quando pedi pela
primeira vez que estudássemos a Austrália e a Espanha houve um clamor contrário
na Áustria e na Europa. Agora, muitos adotaram a mesma linha", disse Kurz
em entrevista à agência austríaca "APA".
Não parece tão claro que
Kurz queria copiar o modelo australiano também no compromisso de receber certo
número de refugiados por ano. A Áustria não acolheu nenhum das 160.000 pessoas
que entraram na Grécia e na Itália, e que a União Europeia acertou repartir por
cotas em dois anos, até o fim de setembro.
"A opinião pública
não apoiará um governo que traga mais gente com programas humanitários, exceto
se tivermos o controle das fronteiras", respondeu o chanceler.
EXTERNALIZAR A
RESPONSABILIDADE
"Não importa o quão
alto sejam os muros ou quão bem armados estejam os agentes, as pessoas que não
têm nada a perder encontrarão uma via de escape para as situações
insuportáveis, inclusive se isso significar arriscar a vida em viagens
perigosas", afirmou o secretário-geral da Anistia Internacional, Salil
Shetty.
Para Shetty, o elogiado
modelo australiano é um exemplo de "externalização da
responsabilidade". Por esse motivo, ele expressou preocupação, em
entrevista à agência australiana "AAP", com o fato de a Europa e as
novas nações terem se interessado pelo modelo.
"A questão
verdadeira é que esses países não oferecem uma rota segura e legal. Assim, de
maneira efetiva, encorajam o modelo de negócio dos traficantes", avaliou
Shetty.
"Quando os governos
dão respostas fragmentadas e inconsistentes à gestão dos fluxos migratórios,
assumem os contrabandistas, traficantes e redes criminais transnacionais",
alertou o representante do Alto Comissário das Nações Unidas para os
Refugiados, Filippo Grandi.
A Europol calcula que
90% do tráfico de imigrantes pelo Mar Mediterrâneo está nas mãos de redes
ilegais. Um panorama semelhante se repete na América Central e no Sudeste
Asiático.
Em um discurso em
Bruxelas em dezembro do ano passado, Grandi criticou os países europeus pela
gestão da crise migratória de 2015 e defendeu que eles abandonassem as
políticas nacionais sobre o assunto para abordar o tema de modo global.
A oportunidade seria um
pacto que a ONU acertou negociar com o objetivo de aprová-lo em setembro de
2018.
"Todos os países do
mundo concordaram que precisamos de um sistema migratório mais ordenado, termos
mais canais regulares para a migração e fazê-la de forma mais segura. Como isso
será feito segue em aberto", disse à "DPA" o chefe da divisão de
investigação da Organização Internacional de Migrações (OIM), Frank Laczko.
O Pacto Mundial para a
Migração Segura, Regular e Ordenada será acompanhado de outro tratado
internacional sobre os refugiados, no qual se espera que os países assumam
compromissos mais explícitos para protegê-los.
O texto deve ser
negociado entre fevereiro e julho de 2018, para que seja adotado em uma cúpula
de chefes de Estado e de governo que será realizada antes da Assembleia Geral
da ONU em setembro.
O diretor da OIMI,
William Lacy Swing, está convencido que são necessárias mais rotas legais para
proteger os imigrantes.
"E precisamos
descriminalizar a migração, de modo que o migrante irregular não seja colocado
em centros de detenção", disse Swing em entrevista à agência suíça
"SDA".
Swing questiona a visão
negativa que a sociedade tem do imigrante, uma opinião compartilhada por
Shetty, que critica o fato de alguns governos associarem os refugiados aos
terroristas.
A representante especial
da ONU para a Migração Internacional, Louise Arbour, pediu em maio para que as
políticas migratórias superem a mentalidade do "nós contra eles".
"O migrante não é
uma carga, muito menos uma ameaça. Gerida corretamente, a migração beneficia a
todos", afirmou.
"O sucesso
dependerá em grande medida do nosso compromisso firmado, da palavra e dos
fatos, para mudar a ótica com a qual olhamos à migração", completou.
Para Arbour, os fluxos
migratórios têm um impacto incrivelmente positivo na sociedade, mas são um
fenômeno temido por muitas pessoas atualmente.
EFE
www.miguelimigrante.blogspot.com
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