segunda-feira, 2 de janeiro de 2017

Bispo desafia governo austríaco e barra construção de cerca contra migrantes

O posicionamento de um bispo austríaco — que se recusou a permitir a construção de um cerca contra migrantes no terreno de sua igreja na cidade de Eisenstadt — ajudou a mudar, ao menos localmente, a política do governo do país sobre segurança de fronteiras.
O posicionamento de um bispo austríaco — que se recusou a permitir a construção de um cerca contra migrantes no terreno de sua igreja — ajudou a mudar, ao menos localmente, a política do governo do país sobre segurança de fronteiras.
“É designação direta de Deus ajudar os necessitados”, disse o bispo Ägidius Zsifkovics de Eisenstadt, na região austríaca de Burgenland, na fronteira com a Hungria.
Sua compaixão encorajou centenas de voluntários a ajudar refugiados e colocar a região no mapa no que se refere à integração de pessoas deslocadas e em busca de asilo.
Mohammad Reza Eslami chegou do Irã com sua mulher Mozhgan e suas filhas gêmeas Nikta e Niousha, de 15 anos, antes de o plano de construção da cerca. “Queremos ficar aqui, é lindo”, disse Mohammad.
Depois da crise de refugiados de 2015, as autoridades austríacas consideraram construir a cerca. Mas, agora, naquele vilarejo, será construído um posto de controle, e o exército será mobilizado quando for necessário.
Zsifkovics afirma não ter objeções ao novo esquema de segurança. “Cada Estado tem o direito de proteger suas fronteiras”, declarou. Em entrevista de Viena, o bispo, cujos antepassados croatas fugiram dos otomanos cinco séculos atrás, explicou por que ficou horrorizado com a ideia de uma cerca em Burgenland.
“Cresci aqui, com a Cortina de Ferro, e experimentei as humilhações ao atravessar a fronteira, com o meu avô. Ele era comerciante de vinhos, vendia para clientes húngaros.”
Quando o governo anunciou seu plano, três em cada 20 proprietários de terras da região, incluindo a igreja, recusaram-se a cooperar. O bispo chegou a se reunir com o ministro do Interior austríaco, Wolfgang Sobotka, para explicar sua posição.
“O governo não ficou contente”, disse ele. “Mas as discussões terminaram quando deixei claro que não haveria cerca no terreno da igreja enquanto eu fosse bispo de Eisenstadt”.
O clérigo também contrariou paroquianos, que ficaram temerosos quando, no outono de 2015, viram 200 mil refugiados atravessarem a fronteira da Hungria.
“Eles estavam atravessando a fronteira a pé”, disse o bispo. “Os mais velhos ficaram assustados, e disseram: ‘os russos estão chegando’. O medo não é um bom professor”.
Para ajudar a comunidade local a superar o temor, a organização Caritas entrou em ação, recrutando centenas de voluntários. A maior parte dos refugiados seguiu viagem, mas a arquidiocese de Eisenstadt deu abrigo temporário a 1 mil pessoas, e está agora ajudando a integrar mais de 500 que escolheram ficar na cidade.
“Planejávamos ir à Alemanha”, disse Jaodat Akraa, de 21 anos, de Alepo. “Mas conhecemos pessoas tão legais da igreja que decidimos ficar aqui. Este foi o primeiro lugar que nos recebeu bem”.
A família Akraa — mãe, pai e três crianças — está acomodada no vilarejo de Pöttsching em um apartamento que anteriormente era uma delegacia. Jaodat faz trabalho manual para a comunidade, enquanto também viaja a Viena para estudar na Universidade Técnica. Sua irmã Rand, de 20 anos, que já se formou na Síria, trabalha no jardim de infância local.
Kingsley Okonweze, de 25 anos, e Amen Goody Saint Paul, de 23, da Nigéria, estão dando aulas de educação física para pessoas com deficiência em uma residência administrada pela Caritas no vilarejo de Wimpassing an der Leitha.
“Nossa casa precisava de caras novas”, disse a administradora Christina Schaffler. “As visitas de Kingsley e Goody são interessantes e divertidas”.
Os jovens, ambos cristãos, disseram ter fugido da Nigéria por questões religiosas e políticas. Eles acreditam estar fazendo algo útil enquanto esperam uma resposta sobre seu pedido de asilo. “Gosto dessa área de terapia esportiva”, disse Kingsley. “Quero terminar meus estudos, conseguir um emprego e formar uma família aqui”.
Em Haus Klara, um antigo monastério que é agora residência de refugiados no vilarejo de Forchtenstein, mulheres afegãs e austríacas reúnem-se para costurar, enquanto tomam chá e comem bolinhos.
Os afegãos normalmente esperam mais tempo que os sírios pelas decisões sobre pedidos de asilo, disse a administradora da residência, Nicole Bogner. “Oferecemos alguns empregos de limpeza na casa, para que eles possam ganhar algum dinheiro, e eles aceitam para se ocuparem”, declarou.
Paralelamente, Rula Aborashed, de 39 anos, e seu marido Amjad Ibraheem, de 31, ambos palestinos da Síria, dramatizaram a história de Ali Baba e os 40 ladrões em um festival de contos de fada apresentado na emissora de TV local no início deste ano.
Rula e Amjad, que viviam no monastério de Haus Franziskus em Eisenstadt, tiveram uma viagem difícil para deixar a Síria. Passaram por território dominado pela frente Jabhat al-Nusra e foram beleados pelo exército turco. Eles sonham em ter um passaporte austríaco e tornar Burgenland sua casa.
Burgenland já havia registrado ondas de refugiados anteriormente — húngaros, que atravessaram a fronteira depois que os tanques soviéticos reprimiram sua revolução em 1956, e alemães do Leste, que deixaram o país em 1989.
Os recém-chegados vieram de mais longe e têm diferentes culturas. “Mas, depois da reação inicial sobre ‘quem são eles?’, a maior parte das pessoas demonstrou uma atitude generosa, e houve ajuda e aceitação para os refugiados nesta parte da Áustria”, disse o bispo Zsifkovics.
Acnur
www.miguelimigrante.blogspot.com

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