sábado, 1 de outubro de 2016

Em abrigo na França, crianças refugiadas tentam construir novo mundo longe de casa

Um centro em Saint-Omer, norte da França, oferece abrigo e proteção a 45 crianças e jovens refugiados que chegaram ao país desacompanhados. O centro de acolhimento conta com atividades como aulas de francês, matemática, música, artes, esportes, cinema e jardinagem.
Em 2015, as crianças representavam mais da metade do total da população de refugiados do mundo (21,3 milhões de pessoas) e o número de crianças desacompanhadas ou separadas em trânsito também cresceu dramaticamente.
Crianças desacompanhadas do Sudão e do Afeganistão participam de aulas de jardinagem, uma das diversas atividades oferecidas pelo centro de Saint-Omer. Foto: ACNUR/F. Scoppa
Crianças desacompanhadas do Sudão e do Afeganistão participam de aulas de jardinagem, uma das diversas atividades oferecidas pelo centro de Saint-Omer. Foto: ACNUR/F. Scoppa
Em um dia nublado na cidade de Saint-Omer, norte da França, Ibrahim, que veio de Darfur, no Sudão, está cultivando legumes ao lado de outros oito adolescentes. Com idades que variam entre 14 a 17 anos, eles estão entre os poucos que tiveram a sorte de conseguir um lugar na Saint-Omer’s Maison du Jeune Réfugié, uma casa para jovens refugiados administrada pela ONG francesa Terre d’Asile.
Ao todo, 45 crianças vivem no local, um dos poucos a oferecer acomodação e proteção para crianças desacompanhadas que viviam em um acampamento improvisado conhecido como “the jungle” (a selva), próximo a Calais.
No centro de Saint-Omer, eles encontraram abrigo e proteção, podendo voltar a ser criança novamente — ao contrário da “selva” onde as crianças dormem ao relento em abrigos improvisados e correm constantes riscos de violência e abusos. Muitos já haviam enfrentado perigos quando percorreram rotas inseguras por diversos países europeus.
A jardinagem é uma das atividades de lazer oferecidas pelo centro e é muito popular entre os residentes. As crianças plantam, cultivam e colhem alfaces, abobrinhas, tomilho, tomates, manjericão e ruibarbo.
Germaine Tetou, assistente social em Saint-Omer, está ensinando os nomes dos vegetais e das ferramentas de jardinagem em francês. Eles repetem o que aprendem e riem uns dos outros pela pronúncia das novas palavras.
Tetou, que chegou na França como refugiada do Benim, disse que as crianças aprendem rapidamente. “Todos os dias me sinto grata por ter esse trabalho”, ela diz. “Eu sei o que eles passaram”.
A prática da jardinagem faz com que Ibrahim*, de 14 anos, lembre-se da fazenda de sua avó, em Darfur. “Eu gosto de tudo aqui em Saint-Omer, especialmente de cuidar do jardim”, disse. Ele já está na França há 42 dias, incluindo os 15 que passou na “selva”, onde dormia em um abrigo provisório com outros adolescentes que, assim como ele, foram forçados a fugir de Darfur sem os pais.
“A França tem a obrigação de proteger crianças desacompanhadas que vivem na conhecida ‘selva’, em Calais”, disse Ralf Gruenert, representante da Agência da ONU para Refugiados (ACNUR) na França. “Isso significa, sobretudo, oferecer soluções de moradia e assistência legal, social e de saúde, e também estabelecer um sistema viável e rápido de reunião familiar para as crianças desacompanhadas que têm famílias em outros países europeus, incluindo o Reino Unido, onde tal movimento é uma prioridade”.
As atividades no centro incluem aulas de francês, matemática, música, artes, esportes, cinema e jardinagem. Há também uma biblioteca.
Depois do almoço, Manal*, um jovem sudanês de 16 anos, olha algumas imagens dos castelos do sul da França. “Que bonito! Onde fica isso?”, pergunta. Ele quer encontrar a localização no mapa para checar se seria possível fazer uma visita.
Durante a tarde, alguns dos moradores irão ao cinema, onde os filmes “Os Caça-Fantasmas” e “Star Trek: Sem Fronteiras”, estão entre as suas escolhas. Depois disso, planejam jogar futebol no parque. Eles se sentem seguros no centro, onde têm a possibilidade de sonhar como crianças uma vez mais.
Jamal* é de Ghazni no Afeganistão, tem 17 anos e chegou sozinho em Calais depois de fugir de casa. Ele diz que se sente bem em Saint-Omer e sonha em se tornar engenheiro eletrônico. “Aqui não há conflitos como havia na ‘selva’. Eu gosto de tudo aqui, mas minha atividade preferida é aprender francês”.
Centros de acomodação e lugares para crianças são limitados. A maior parte das crianças desacompanhadas que vivem em Calais não tem as mesmas oportunidades que Jamal e Ibrahim tiveram. “Todos os dias recebemos solicitações para acolhermos mais crianças, mas somos obrigados a recusar já que o centro está atualmente lotado”, disse o diretor, Jean-Francois Roger. “É preciso criar mais lugares. As crianças precisam viver em um ambiente seguro”.
De acordo com dados de ONGs, cerca de 850 crianças desacompanhadas vivem na ‘selva’ em Calais. Como uma medida emergencial, 215 menores foram acomodados em um campo temporário de recepção (Le Centre d’Accueil Provisoire, conhecido pelo acrônimo em francês CAP) e o centro Jules Ferry para mulheres e crianças, que são geridos pela organização La Vie Active. Ambos já estão lotados e não podem acomodar mais ninguém. As outras crianças continuam vivendo em tendas e abrigos improvisados na ‘selva’.
Em 2016, dos 300 mil refugiados e migrantes que chegaram à Europa, 28% são crianças e muitas delas estão viajando sozinhas. Na Itália, 15% das pessoas que chegaram desde o início do ano são crianças desacompanhadas.
Em 2015, as crianças representavam mais da metade do total da população de refugiados do mundo (21,3 milhões de pessoas) e o número de crianças desacompanhadas ou separadas em trânsito também cresceu dramaticamente.
As tensões em Calais aumentaram nas últimas semanas quando manifestantes franceses bloquearam o acesso ao túnel ferroviário de Calais para pedir o fechamento da ‘selva’.
Acnur
www.miguelimigrante.blogspot.com

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