quinta-feira, 7 de abril de 2016

Estrangeiros deixam seus países para mudarem de vida no Espírito Santo

Em meio a crise econômica e política que o Brasil vive, e vários outros fatores, muitos brasileiros deixam o país em busca de uma vida melhor. É isso que estamos acostumados a ver, mas existe também o outro lado. Estrangeiros também mudam-se para a nossa terra em busca da mesma coisa: uma vida diferente. Aqui eles trabalham, se casam, constroem uma família e se apaixonam pela nossa cultura. 
De acordo com a Polícia Federal (PF), ao todo, o Brasil conta com mais de 1 milhão de estrangeiros que vivem de forma regular no país. Desse número, 270.528 são portugueses, 88.572 bolivianos e 86.243 são japoneses. Segundo a PF, esses dados foram extraídos no dia 20 de janeiro deste ano. Em 2014, a Polícia Federal registrou a entrada de 121.443 estrangeiros. Em 2015, esse número caiu para 118.309.
Alguns estrangeiros já entram no Brasil com a intenção de morar, mas outros decidem ficar por conta de um amor ou de oportunidades que foram abertas. E o Espírito Santo também foi o estado escolhido para se tornar a nova casa de alguns deles. Foi o caso do estudante Lourenço Pedro Manhice, de 21 anos, que mora no Estado há um ano.
Foto: Jonathas Correia
Lourenço se mudou para o Estado há pouco mais de um ano
Foto: Jonathas Correia
Mudança
Após perder os pais ainda quando criança, o estudante morava na casa de parentes em Moçambique, no Continente Africano. Em 2010 Lourenço conheceu um brasileiro, o pastor Ozenir Correia, que hoje considera como pai. Foi ele quem trouxe o jovem para o Brasil. 
“Eu estava numa praça da cidade, onde as pessoas vendem artigos culturais, vendendo instrumentos musicais. Naquele dia vi o meu pai, que havia viajado em missões, e fui lhe apresentar meu material. Mesmo não interessado em comprar, ele me pegou pela mão e perguntou quem eu era. Ele se importou comigo. Meu pai biológico morreu atropelado na África do Sul, e a minha mãe eu não conheci. Eu vivi na roça com parentes. Depois fui morar com a família de um primo e passei a vender os instrumentos. Ele [o pastor] me perguntou se eu queria morar no Brasil e eu disse que sim”, contou. 
Antes que a documentação ficasse pronta, para que o estudante pudesse morar no Brasil, ele passou a receber ajuda da família brasileira. “Eu não tinha documentos e meu pai tirou todos para mim. Ele também me mandava roupa e me ajudava com outras coisas. A parte da documentação para morar aqui no Brasil foi difícil, pois ele queria me adotar. Como não conseguimos, entramos com o pedido de visto para estudante. Foi então que conseguimos a autorização para eu vir para cá”, explicou.
Mesmo o português sendo uma das línguas faladas em Moçambique, Lourenço não dominava o idioma. “Quem começou a me alfabetizar foi a minha mãe, que já foi professora. Depois eu comecei a frequentar a escola. Um dos idiomas que eu falava lá era o Changana. Eu não falava o português, mas muitos em Moçambique falam, então eu entendia um pouco. Por isso não foi tão difícil aprender”, disse.
O sonho dele é de continuar estudando e um dia ingressar em uma faculdade, mas em várias ocasiões sentiu saudades da terra natal. “Minha vida lá era bem difícil. Eu trabalhava muito, saía de casa cedo e voltava tarde, não estudava, não sabia ler e escrever. Nós não tínhamos muitas condições financeiras. Mas mesmo assim sinto saudade da minha terra, do meu país, só que a vida aqui para mim é melhor. Ficar aqui não depende só da minha vontade. Meu visto tem validade e não sei até quando vou conseguir renovar. Mas agradeço a Deus, porque ele foi muito bom comigo e usou o meu pai para ir até lá me conhecer”.
 Moçambique
Foto: Arquivo Pessoal
Manuel mora há cerca de 10 anos no Brasil
Foto: Arquivo Pessoal
Também de Moçambique, Manuel Silva mudou-se para o Brasil há cerca de 10 anos. Primeiro ele foi estudar em Brasília e depois seguiu para Minas Gerais. “Estudei durante um ano em Brasília, mas como um irmão meu já estudava em Viçosa, ficaria mais barato eu também estudar lá e junto com ele. Então, pedi transferência. Lá conheci a minha esposa, que é de Vitória. Namoramos e, quando o curso acabou, tive que decidir a minha vida. Era mais viável voltar para o meu país, por conta da família, mas decidi me casar e morar no aqui”.
Manuel se mudou para Vitória, onde vive há cinco anos, após se casar. Ele contou que no início não foi fácil, mas que já criou raízes. “Toda mudança é difícil. Eu conhecia Vitória, mas havia criado vínculos em Minas Gerais e, além disso, sentia falta da minha família. Foi difícil decidir construir minha vida no Espírito Santo, mas valeu a pena. A cultura do Brasil é diferente, mas temos muita influência brasileira lá, assistimos programas de televisão daqui, e com essas informações tudo fica mais fácil. A adaptação acaba sendo mais rápida”.
Mesmo se adaptando mais rápido que outros estrangeiros, ele disse que teve que se acostumar com a comida brasileira. “Os alimentos que temos aqui também existem no meu país, só que lá preparamos de outras formas. Os brasileiros comem muito feijão e nós não, mas eu já me acostumei e passei a não ficar sem. Lá comemos muita carne ensopada com legumes, arroz e misturamos tudo. Até a nossa feijoada é diferente. Fazemos com legumes e usamos outras carnes”, explicou.
A vida de Manuel agora é aqui, mas muitas vezes, segundo ele, a saudade bateu forte. “Eu já senti vontade de voltar para Moçambique por causa da saudade. Já fiquei três anos sem ver minha família. O que mais me afeta é o medo de acontecer alguma coisa com meus pais e eu estar longe. Talvez um dia eu volte, mas precisaria de uma boa proposta de trabalho. Eu gosto daqui. Acho Vitória linda. Moro perto da praia e a orla é maravilhosa. É uma cidade pequena, mas tenhoo acesso a tudo. Além disso, o Estado tem lugares fantásticos”.
 Itália
Federico se mudou para Vitória após conhecer uma capixaba
Foto: Reprodução Facebook
Morando há 20 anos no Espírito Santo, o italiano Federico Dalsasso não pensa em retornar ao seu pais de origem. Ele se mudou para Vitória após conhecer e se apaixonar por uma capixaba que estudava na Itália. “Ela já estava lá há um ano, e nós começamos um relacionamento que depois ficou sério. Em 1995 decidimos fazer uma viagem para o Brasil, pois era um país que eu ainda não conhecia. Fiquei alguns meses aqui e gostei muito da cidade, das pessoas, da família dela. Voltei para a Itália, conversei com os meus pais e disse que voltaria para o Brasil para me casar. Mudei para cá, casei e tive dois filhos. Hoje eles já estão grandes e eu me divorciei”, explica.
Um dos grandes desafios ao se mudar para o Brasil, segundo ele, foi se adaptar ao idioma. “Foi demorado aprender o português, até porque em casa eu falava italiano. É uma língua difícil. Só depois de seis meses eu comecei a falar um pouco. Eu aprendi primeiro a ler, e depois a falar no dia a dia. Já no primeiro ano em que eu estava aqui fiz um curso para estrangeiros. Nele eu aprendi a escrever e aprendi os acentos, que são diferentes do italiano. A parte mais difícil para mim foi a acentuação”, destacou.
Diferente da dificuldade com a língua, a comida não foi um problema. Na verdade, foi uma das coisas que mais chamou a atenção do estrangeiro. “A comida eu gostei logo no primeiro dia. Eu cheguei no Rio de Janeiro e visitei uma churrascaria. Na Itália não existe isso, eu não conhecia esse negócio de rodízio e fiquei doido. Gostei muito. Só não frequento restaurantes mais sofisticados, pois quando querem elaborar a comida para imitar algum prato lá de fora não me agrada muito. Já a massa daqui, eu prefiro fazer em casa”, brincou.
Além da alimentação diferente, o italiano também precisou se adaptar a novos costumes. “Como somos latinos, a cultura é bem parecida. Somos muito animados. A diferença que senti foi na pontualidade. Aqui as pessoas não são tão pontuais com os compromissos. Já lá na Europa é tudo certinho, você não pode sair do que foi marcado”, contou.
E para trabalhar no Brasil ele precisou dar entrada em alguns documentos, como a carteira de trabalho brasileira. “Tenho os direitos que todo brasileiro tem. A diferença é que eu não tenho RG daqui, e sim RNE, que é o Registro Nacional de Estrangeiro. É um documento brasileiro, emitido pela Polícia Federal, que todos os estrangeiros, com visto de permanência, precisam ter. Eu só tenho uma cidadania, que é a italiana, estou aqui como estrangeiro”. 
Mesmo não pensando em voltar para a Itália, Federico ainda sente falta do que deixou para trás. “Nesses anos eu senti saudade várias vezes e cheguei até a voltar para lá, em 2010, depois que me separei. Após seis meses na Itália, a saudade dos filhos, do Brasil, dos amigos que fiz bateu mais forte e eu resolvi voltar. Aqui eu entrei em um curso, me formei como radialista e tive a sorte de arrumar um emprego. Eu não estou arrependido, gosto daqui".
Para trabalhar no Brasil é necessário ter uma autorização
Foto: Reprodução
Legalidade
De acordo com o Ministério das Relações Exteriores, a legislação permite o trabalho de estrangeiros no Brasil através da emissão de um visto. Essa autorização é concedida pelo Ministério do Trabalho e Previdência Social (MTPS), normalmente a pedido de uma empresa à Coordenação Geral de Imigração através de umaferramenta que está no site do MTPS. Mas também há outras formas do estrangeiro se legalizar no país. 
Se esse estrangeiro foi beneficiado com anistia; se obter status de refugiado, através de Visto Humanitário (no caso dos haitianos), por autorização do Conselho Nacional de Imigração (Cnig), referendada pelo Ministério da Justiça; em razão de casamento com brasileiro; filho de brasileiro e sul americano residente, por exemplo, ele pode morar e trabalhar no Brasil. 
Segundo o Ministério do Trabalho, a autorização de trabalho para estrangeiro é de competência da Coordenação Geral de Imigração - Ministério do Trabalho e Emprego, já o Visto é de competência do Ministério das Relações Exteriores, que autoriza um registro no passaporte do estrangeiro que lhe permite entrar e permanecer no país.
Um estrangeiro que tenha o visto permanente tem os mesmos direitos que os brasileiros, como acesso a serviços de saúde e educação, além de poder abrir empresa, conta bancária, tirar carteira de motorista, entre outros. Só não pode votar, nem se eleger a cargos políticos.
Folha Vitoria
www.miguelimigrante.blogspot.com

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