sábado, 27 de junho de 2015

Migração haitiana é debatida em audiência pública da Comissão de Direitos Humanos

As políticas públicas e a atuação efetiva das autoridades em relação aos recentes fluxos de imigração haitiana para o Brasil e, notadamente, para o Estado de São Paulo foram analisadas em audiência pública realizada nesta quarta-feira, 24/6, na Comissão de Defesa dos Direitos da Pessoa Humana, da Cidadania, da Participação e das Questões Sociais (CDH). 

O presidente da CDH, deputado Carlos Bezerra Jr. (PSDB), mostrou-se muito preocupado com a situação dos imigrantes haitianos, que deixam seu país via "coiotes", que recebem muito dinheiro para trazê-los, e cujo modo de ação não é bem conhecido. Para o deputado, muitas pessoas lucram com esse tráfico que atinge milhares de pessoas, o que considerou um escândalo. 

A deputada Beth Sahão (PT) lembrou que São Paulo é muitas vezes apenas rota de passagem, além de ser uma cidade historicamente construída por imigrantes. Ela preocupou-se ainda com casos de racismo e preconceito que já aconteceram com os imigrantes. O presidente Bezerra Jr. lembrou que o foco da audiência é a preocupação com que se aproveita das vulnerabilidades dos imigrantes. "Esses coiotes devem ser identificados e sua ação coibida", explicou. 

O deputado Coronel Telhada (PSDB) criticou o Acre por "deportar" para São Paulo os imigrantes, e preocupou-se com o fluxo crescente de imigrantes que, ilegais, deveriam ser extraditados. Disse ainda que o governo brasileiro facilita o crime de tráfico de pessoas ao receber esses imigrantes. 

Direto do Acre 

Foi transmitido depoimento on line da professora Letícia Mamed, do Centro de Filosofia e Ciências Humanas da Universidade Federal do Acre (Ufac) e integrante do Grupo de Pesquisa "Mundos do Trabalho na Amazônia" (CNPq-Ufac), que desenvolve tese sobre a trajetória dos imigrantes haitianos na fronteira acreana. Segundo ela, desde 2010 já chegaram via Acre cerca de 40 mil imigrantes, a maioria haitianos e senegaleses, estes vindos via Espanha. 

A professora Letícia Mamed falou ainda das rotas que os imigrantes percorrem desde o Haiti e da situação no país, onde 80% da população está abaixo da linha de pobreza. Em sua maioria são negros e com baixa escolaridade. 

Ela destacou que os imigrantes gastam de 2 a 5 mil dólares para fazer a viagem, dinheiro esse obtido pela venda de bens, economias familiares ou empréstimos, que comprometem o futuro ganho no Brasil, onde parte dos valores recebidos é enviado para sustentar as famílias que ficaram em seu país de origem. 

O Acre, continuou a professora, é um lugar de passagem, onde os haitianos - que antes eram só homens e agora são mulheres, crianças e idosos - recebem documentos e são contratados para trabalhar em outras partes do país. A maioria consegue vagas na construção civil, mas os que vão para o sul do Brasil vão trabalhar em frigoríficos, e onde já existem comunidades haitianas consolidadas. 

Crise humanitária 

Secretário estadual da Justiça e da Defesa da Cidadania, Aloísio de Toledo César expressou sua preocupação com a "violação dos direitos humanos, e também do código penal" que sofrem os imigrantes, que são "quase vítimas de tráfico de escravos em pleno século 21". Disse que o governador está preocupado com a situação. 

Representante da Secretaria Nacional da Justiça, João Guilherme Lima Granja Xavier discorreu sobre o que o ministério tem feito a respeito dos imigrantes. Ele garantiu que o trabalho de concessão de vistos humanitários na embaixada brasileira no Haiti está sendo revisto, o que ajudaria a reduzir a ação dos coiotes. 

Secretário-adjunto de Direitos Humanos e Cidadania de São Paulo, Rogério Sottili falou das ações da prefeitura para o acolhimento destes imigrantes, que incluem cursos, inclusive de qualificação profissional. Ele comentou que esteve no Haiti logo após o terremoto, e viu que "o país acabou", e que lá há uma crise humanitária séria. 

Coordenador da Organização Missão Paz São Paulo, o padre Paulo Parise, que desde 2010 recebeu mais de 9 mil haitianos, falou das dificuldades que enfrenta, pois o fluxo de imigrantes - não só haitianos - é constante, e há necessidade de mais locais para acolhimento. Ele informou que a embaixada haitiana não tem emitido a renovação dos passaportes, o que tornará os imigrantes ilegais se o serviço consular não for restabelecido em breve. 

Coordenadora do Núcleo de Enfrentamento ao Tráfico de Pessoas da Secretaria da Justiça e da Defesa da Cidadania do Estado de São Paulo, Juliana Armede sugeriu a realização de reuniões do Ministério da Justiça para discutir ações que os Estados que recebem imigrantes podem fazer para seu acolhimento. Sugeriu ainda que os deputados destinem recursos, via emendas parlamentares, para os serviços que atendem os imigrantes.

Representante do Ministério do Trabalho, Marco Antonio Melchior falou da preocupação com os desrespeitos trabalhistas que podem atingir os imigrantes. Citou que em 2014 aconteceu o primeiro resgate de um haitiano em oficina de costura em trabalho análogo à escravidão. 

O presidente Bezerra Jr. disse que esta é a primeira de muitas audiências que abordarão o tema. Há um verdadeiro tráfico de pessoas envolvendo os haitianos, e portanto outras entidades deverão ser ouvidas pela comissão, como a Abin e a Polícia Federal. Ele lamentou ainda o "incrível esforço que está havendo no Congresso Nacional para desconstruir o trabalho contra o trabalho escravo". 

ASSEMBLEIA LEGISLATIVA DO ESTADO DE SÃO PAULO

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